Nascida
epífita e espontaneamente, semeada no andar superior da floresta por
algum pássaro que se alimentou de seu fruto, esta impressionante
árvore resplandece independente do lugar, exibindo poderosas raízes
que contrastam com as sombras silvestres e com a folhagem verde
escura de uma monstera escandente em seu tronco.
É
uma árvore que cresceu na contra mão do usual e comportado de baixo
para cima da maioria das árvores. Seu broto nasce no galho de uma
árvore, suas raízes descem e ao atingir o solo, começam a se
transformar em poderosas raízes. Quem a vê imagina que seja pra lá
de centenária, mas foi devido a um expediente ”nada louvável”
que, em menos de 40 anos de pura “ingratidão”, chega a alcançar
um avantajado porte: ela estrangulou sua hospedeira – a árvore,
que lhe serviu de berço e de escada – da qual se nota ainda algum
vestígio de sua “vitima”, quase totalmente emparedado em
celulose. As outras árvores que estão em seu caminho sofrerão as
mesmas consequências. No Estado da Bahia é comum visualizar estes
brotos de desenvolvendo até mesmo em construções civis.
O
gênero Ficus,
da família Moraceae,
conta com mais de 1.000 espécies, em geral de folha perene, que
apreciam climas amenos em regiões tropicais ou subtropicais e são
muito usadas como árvores ornamentais. As flores são diminutas e
estão ocultas em cápsulas polposas que depois se transformam nos
frutos: um doce figo lampo é afinal um estojinho de flores.
Esta
imponente família de árvores, abriga a rara Divindade Ìrókò,
do qual possui poucos iniciados e consagrados, nos Terreiros
Tradicionais da Nação de ketu. Em território africano, sua esposa
chama-se Agboman e sua única irmã Ondo.
No
sistema oracular de Ifá, Ìrókò esta relacionado
com os Ọba Odú
Òdi Méjì, Ìròsùn Méjì e Ìrẹtẹ̀
Méjì; com os Ọmọ
Odú Ọ̀fún
– Ọyẹku,
Ofun – Ìrọ̀sùn
e Ọ̀fún –
Ọ̀wọnrin,
entre outros e no sistema oracular do owó mẹ́rìndílógún
com os Odú Ọ̀kànràn,
Ìrọ̀sùn,
Èjìonilẹ,
Ọ̀sá,
Ọ̀fún,
Ọ̀wọ́nrín,
Ejìla Ṣebọra,
Èjì Ologbon, Ìká (principal), Obeogúndá, entre
outros. A quantidade de figuras do oráculo acima citado,
atesta a difícil tarefa de identificar esta rara divindade, que aos
olhos daquele que não o conhece com profundidade, acaba por passar
despercebido.
Ìrókò
é o coletivo das Grandes Árvores, a verdadeira essência da
fitolatria. Guardião das florestas centenárias e das mudanças
climáticas, A representação da dimensão tempo – espaço e o
guardião da ancestralidade. Seus mitos o descrevem como com um homem
bonito e forte, que passeava a noite pela floresta com uma tocha na
mão. Espirito Ancestral capaz de muitas mágicas e magias e
respeitado por todos os seres. Sua essência impulsa os bons e maus
pensamento dos caminhantes, pois é, a divindade de todos eles.
Ìrókò,
possui algumas representações
física além da própria árvore, ou seja, não tem “assentamento
convencionais” e sim representações em ferros forjados. Seu
principal àṣẹ
esta plantado, enterrado, “acomodado” entre as poderosas raízes
dessa imponente árvore. Seu tronco ostenta uma faixa ou laço
branco, alertando e deixando bem claro aos demais, que ali reside o
“sagrado”. Delimita-se o espaço de sua morada com uma cerca e
portinhola. Nesse espaço deverá conter um fogareiro, utensílios
domésticos para o preparo das oferendas, potes e jarros, enfim, todo
o ritual de Ìrókò
deverá ser realizado nesse espaço. Quando a necessidade de “limpar”
este espaço, deverá ser usada uma vassoura específica da qual não
poderá ser utilizada em nenhum outro espaço do Terreiro. “O
que se utiliza na casa de Ìrókò não pode ser utilizado em
qualquer outra casa.”
Os
mitos, nos revelam que os pássaros míticos Kotopori (macho)
e Ikujegbe (fêmea) foram os encarregados de espalhar a
semente de Ìrókò do òrun para as diversas floresta
do àiyé.
Muito
se tem discutido sobre o culto de Ìrókò na gameleira
branca, cujo o nome cientifico Ficus religiosa, onde esta
árvore, esta mais relacionada à Ṣàngó.
O termo Gameleira (Ficus doliaria), além de ser a designação
comum a diversas árvores da família das Moráceas
especialmente as do gênero Ficus com madeira utilizada para
a confecção de gamelas e inúmeros objetos domésticos. Na
antiguidade, quando o culto foi estabelecido em nosso país, os
antigos sacerdotes teriam “tratado e acordado entre eles” de que
somente poderia haver um iniciado em cada linhagem, rama ou família
de santo. Nos tempos atuais, o culto a Ìrókò ainda continua
cercado de segredos e mistérios.
Não
se pode podar ou mesmo derrubar a árvore Ìrókò sem que
antes sejam realizados determinados rituais. Quando haja necessidade
de tal, cada pedaço da árvore que se derruba, este deve ser
enrolado em pano branco com determinadas substâncias e despachado,
numa espécie de rito fúnebre.
Esta
proibição esta fundamentada em uma história de Ifá, que
nos revela que: Ìrókò antes de vir a Terra, foi consultar Ifá,
este lhe aconselhou que renderá homenagem à Èṣù,
oferecendo-lhe um bode, um galo, um facão, um machado de lamina
dupla e outros ingredientes, mas este se negou a realizar qualquer
oferenda. Se considerava forte e invulnerável, já que seu porte
avantajado, causava assombro a todos os seres. E ademas, sua casa era
o centro de reuniões dos anciões e anciãs da noite, por isso se
sentia tão seguro. Passando um tempo, Èṣù
insatisfeito com a falta de oferenda, se vingou de Ìrókò. Ensinou
aos seres humanos a eficácia da magia de seus galhos e folhas,
deu-lhe o facão para podar; revelou o quanto era boa e útil a sua
madeira, deu-lhe então o machado para derrubar. Èṣù
dedicou todo o seu tempo, a tarefa de que os seres humanos perdessem
o medo de Ìrókò e também de que, este não tinha nada de
extraordinário, seria simplesmente uma árvore, assim como as
outras. Desde esse momento esta madeira é tão cobiçada e
proveitosa para os homens que as derrubam sem nenhum escrúpulo para
seu próprios benefícios. Assim foi como o grande Ìrókò caiu sob
a força da raça humana, como resultado de sua negligência em
oferecer à Èṣù
o que era de direito.
Os
troncos não podem ser queimados e as folhas não pode serem cozidas.
Não se pode subir nesta árvore, quando for necessário o uso de
suas folhas, colhem-se as que despencaram por si só, ou seja as que
estão caídas no chão. Aquelas com a parte superior voltada para
cima, serão utilizadas para o “bem” e as voltadas para baixo
servem para o “mal”. Para se extrair o sumo de suas folhas, se
faz uso do pilão e de determinadas substâncias, não pode ser
pilada com nenhuma outra folha. A medicina natural de Ìrókò
é conhecida com o nome de ẹrọ
Ìrókò e esta sucessível a diversos feitos tais como: o
tratamento de mulheres estéreis e mesmo o alivio para os distúrbios
mentais.
Na
África, Ìrókò
habita única e exclusivamente a árvore Igi
Ìrókò, de
nome científico Chlorophora
excelsa , da
família das
Moraceae que, por se tratar
de uma espécie nativa do território africano não existia no Brasil
e por condições climáticas não foi para cá transplantada,
embora, entre as mil espécies existente, exista uma que há
substitua.
Para
o povo Ioruba, esta é a mais antiga das árvores e considerada uma
de suas quatro árvores sagradas normalmente cultuadas em todas as
regiões que ainda praticam a religião dos Ioruba. No entanto,
originalmente, Ìrókò
não é considerado uma divindade que possa ser inciado e consagrado
na cabeça de ninguém, somente deverá ser reverenciado e ofertado.
Diferentemente do Brasil, onde houve raras iniciações desta
magnifica divindade. Entre elas a nossa saudosa Mãe
Cidália de Ìrókò
(Cidália Solidade),
que faleceu com 83 anos de idade e superou os 70 anos de de iniciada
pelas mãos de Mãe Menininha do Terreiro do Gantois. Mãe
Cidália, nasceu em 19 de fevereiro
de 1930, bisneta legitima de africanos, foi apontada por Baba
Isalẹ́,
como filha de Ìrókò
ainda na barriga de sua mãe.
Esta senhora foi orientada por Mãe
Menininha,
a levar a criança para fazer santo aos 7 anos de idade.
Ìrókò
é a morada de diversas entidades, principalmente a de espíritos
infantis conhecidos ritualmente como Àbíkú
e tais espíritos são liderados por Oluwere.
Quando as crianças se veem perseguidas por sonhos ou qualquer tipo
de assombração, é normal que se faça oferendas a Oluwere
aos pés de Ìrókò,
para afastar o perigo de que estes espíritos maléficos levem
embora as crianças da aldeia para o òrun.
Durante sete dias e sete noites o ritual é repetido, até que o
perigo de mortes infantis seja afastado. Nem sempre essas precauções
são suficientes para reter as crianças Àbíkú
sobre a terra. Iyájanjansà
(Chefe da sociedade dos Àbíkú
machos) e Olikó
(Chefe da sociedade dos Àbíkú
fêmeas) são muito mais forte e
ambos não deixam agir o que as pessoas tiverem preparado. “Contra
determinados Àbíkú
não há
remédios;
Iyájanjansà e
Olikó os atraíra a força para o Céu”.
Inúmeras
reuniões de Oṣo
(bruxo) e Àjẹ́
(bruxas) são
realizadas ao redor da árvore Ìrókò
onde
são realizados sacrifícios e oferendas as Divindades Tutelar destas
Sociedade.
Os
mitos também nos revelam que, Yéwà
divindade de rara beleza, costuma deitar-se entre as raízes do
Ìrókò,
afim de contemplar sua beleza e vastidão. Esta amplidão é
conhecida entre o povo de santo como àṣẹ
gbà-n-gbà.
A
árvore
Ìrókò não
pode ser cortada antes de que haja determinados rituais. Obviamente
que isto nem sempre é colocada em pratica,
visto
que sua madeira é altamente resistente e amplamente comercializada
no mundo todo. As crenças locais revelam que as casa que a utilizam
são assombradas, a própria madeira produz inquietantes ruídos e
até mesmo um som horrível. Exemplo disto são portas fabricadas com
esta madeira que abrem e fecham sem explicações lógicas.
O
culto a Ìrókò
é um dos mais populares em terras Iorubá e as relações com esta
divindade quase sempre se baseiam na troca: um pedido feito, quando
atendido, sempre deve ser pago pois não se deve correr o risco de
desagradar Ìrókò,
pois ele costuma perseguir aqueles que lhe devem. Há Ìrókò,
em hipótese alguma se promete aquilo que não possa cumprir.
Ìrókò
está ligado à longevidade, à durabilidade das coisas e ao passar
do tempo pois é árvore que pode viver por mais de 200 anos.
Baba
Guido Olo Ajagùnà
(artigo
de minha autoria publicado no Fórum Okitalande )
0 comentários:
Postar um comentário